Wednesday, August 1, 2007

Aos imortais...

Querida mana:

Hoje, por entre a poeira surgiram 4 vultos, perdidos na fumaça de cigarros, vestidos com fardas militares. Dois deles, ao invés de caminharem, arrastavam os seus corpos completamente desfigurados. Outros dois seguiam atrás em passos sem destino. Um deles reparou na atenção que depositei sobre eles, soltou um sorriso sarcástico, sujo pela fumaça do cigarro, e continuou. Eram o resultado de mais uma guerra sem sentido.
Às vezes acho que um soldado acaba por nunca sobreviver. Pode regressar ileso é certo, mas guarda sempre uma última granada para explodir a todo o momento. No seu interior as partículas viciaram-se nos estrondos e chocam entre si violentamente, os tímpanos ressoam constantemente sons de balas e o próprio coração vicia a sua bombagem ao som de rebentos de granadas. As mãos, essas tremem saudosas do peso da arma e os ombros erguem-se na memória dos camaradas que carregaram. Tudo isto quando, à volta, a guerra no seu sentido físico acabou. O mundo apático vai coçando novamente os problemas até fazer sangue e voltar a jorrar a guerra e nos entretantos, aqueles que por lá passaram simplesmente se vêm incapazes de viver ao ritmo de um mundo que esqueceu uma guerra como se ela não tivesse existido, que apresentou menções honrosas aos que morreram por lá e aos que se guardaram para morrer por cá, como pensos a tapar um braço dilacerado.
A verdade é que quando se vive demasiado tempo sobre um grande peso, a leveza torna-se num fardo ainda mais insustentável, antes uma guerra, hoje uma vida desprovida de sentido. A triste ironia dos imortais...

Poderá uma guerra, algum dia sarar?

Do teu, para sempre, irmão.